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SEGUNDA CONSIDERAÇÃO
Os Santos Anjos nos amam por amor de Jesus e de Maria
A primeira medida do amor que os Anjos da Guarda têm por nós lhes é dada pelo próprio
amor de Jesus, e é com o Divino Coração, tão terno e ardente por nós, que eles aprendem a nos amar.
Jesus me ama? Então tenho a certeza de que meu Anjo também me ama muito, pois Jesus muito me amou. «Os Anjos nos amam por que Cristo nos amou»¹, diz São Bernardo.
Além disso, os Anjos têm sempre presente a vontade expressa do Pai celeste, que quer que todos eles à porfia se apliquem a prestar homenagens a seu dileto Unigênito feito homem. O que não farão eles, pois, pelo Homem-Deus ? Pois bem, eis o que Jesus lhes ordena: serem protetores das almas que Ele mesmo redimiu, fazendo-os ver em suas cicatrizes quanto Lhe custou uma só alma, esta pérola preciosa pela muito queridas filhas de suas chagas e destinadas a um dia fazerem parte da família deste excelso Pai, que é também Pai dos Anjos.
Mas o angélico amor cresce ainda mais por causa do amor que eles têm por Maria, sua augusta Rainha. Santa Brígida diz que, tendo Deus dado aos Anjos, assim que começaram a existir, o conhecimento da grandeza da Mãe do Verbo Divino, ficaram eles desde então por Ela incendidos de um amor tão vivo, tão puro, tão reverente que mais se comprazem em poder um dia servi-La do que em serem eles mesmos as principais e mais perfeitas criaturas da onipotência divina. Chegada a plenitude dos tempos, eles se ocuparam com santa emulação em servi-La durante sua vida e elevaram-na em seguida ao Céu em solene triunfo, onde A veneram em seu trono ao lado de seu Filho. Rodeiam-na sem cessar com sua homenagens e felicitam-se por terem sido por Ela escolhidos como dispensadores amantíssimos das ternuras que sua solicitude tem para com nossa pobreza. E Maria, ao expedi-los em nossa defesa e guarda, lhes diz "São os meus filhos que Deus me deu" (Gen. 48, 5). Estas almas que confio a vosso cuidado são minhas filhas, que possuo pela solene doação que o próprio Jesus me fez do alto da cruz na pessoa de São João. Delas sou mãe e rainha, e vô-las confio. Se ao reflexo deste amor os corações dos apóstolos inflamavam-se a ponto de não recuarem ante os esforços, as privações, as torturas e até mesmo a morte mais cruel, contanto que fosse para o bem das almas, que ardor por
mim não suscitará o amor angélico do meu Anjo da Guarda, que inflama-se ao receber os
raios de amor do Coração de Maria?
Ah ! Meu querido Anjo, não posso entender o amor que tendes por mim, porque tampouco
posso entender vosso amor por Jesus e Maria, e entendo ainda menos o amor que têm Estes por mim. Uma só coisa me é clara, que sou culpado de ter tão mal correspondido até agora. Oh! Anjo meu, tão afetuoso protetor de minha alma, que ao espelhar-Vos continuamente nos corações de Jesus e de Maria, deles obtendes novas flamas de amor divino, fazei que doravante meu coração não pense senão em Vos amar, a Jesus meu Redentor e a Maria minha mãe amantíssima.
PRÁTICA
Ao ir à igreja, especialmente durante a celebração da Santa Missa, convidai vosso Anjo da
Guarda a adorar convosco Jesus sacramentado, e quando não puderdes ir, pedi-Lhe que o faça em vosso nome. Fazei o propósito de cumprimentar Maria Santíssima com a recitação do Angelus, saudação muito agradável à Virgem e aos Anjos, através da qual pode-se ganhar indulgências.
EXEMPLO
A vida da beata Maria Crucificada manifesta-nos concretamente o que foi exposto na
presente consideração. Esta grande serva de Deus, guiada e confortada por seu Anjo da
Guarda, chegou rapidamente a tão alto grau de perfeição que sempre exclamava com São
Paulo o desejo de separar-se do corpo para unir-se a Jesus, seu celeste esposo : «Desejo
morrer e estar com Cristo» (Filipenses 1, 23). Num êxtase, viu uma multidão de anjos, onde parte queria conduzi-la ao Paraíso, como ela ardentemente desejava, ao passo que outros
anjos ainda a queriam em vida para merecer uma coroa ainda mais preciosa no céu. Então
apareceu Maria Santíssima e, tendo proferido uma só palavra, todos os anjos uniram-se a Ela cantando unânimes: Gloria in excelsis Deo. Maria Crucificada viveu ainda alguns anos, até que aqueles anjos que na terra haviam-na assistido com sumo cuidado, acompanharam festivamente sua alma ao céu, honrando também o corpo e o sepulcro da falecida com muito alegres melodias, ouvidas por várias pessoas.
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1 - São Bernardo, Sermões, 1º Sermão sobre São Miguel, nº 3.