
Por Gustavo Corção publicado n’O Globo em 03 de fevereiro de 1972
"Compete a todos os fiéis, principalmente aos clérigos, aos Constituídos em dignidade eclesiástica e aos que são eminentes pela doutrina, enviar os livros que julgarem perniciosos aos Ordinários do lugar ou à Sé Apostólica; de modo especial compete esse mister aos Legados da Sé Apostólica, aos Ordinários do lugar e aos Reitores de Universidades". CÓDIGO DE DIREITO CANÔNICO (ainda não demolido) art. 1.397.
COMO nada foi feito por aqueles a quem competia especialmente tal mister, e como se trata de mais um pernicioso "catecismo", agora meio-sangue holandês, e de mais uma obra aprovada pelas autoridades eclesiásticas, declaradamente difundida à sombra do Instituto Nacional de Pastoral da CNBB, e acintosamente elogiada pelo presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, e além disso se trata de obra elaborada em três opúsculos, a partir de 1970, por um padre já inutilmente denunciado aos Ordinários do lugar como promotor de indecorosos encontros de jovens em chamadas "missas jovens", o simples fiel, o menos imperativamente designado pelo Código de Direito Canônico se acha no dever de suplicar ao Sr. Núncio Apostólico que encaminhe esta carta à Santa Sé com especial apelo ao coração de Sua Santidade Paulo VI, cuja autoridade é afrontosarnenta negada nas publicações catequéticas do Pe. Rodolfo Jesoirens, editadas pela SONOVISO.
SANTÍSSIMO Padre,
AJOELHADO aos pés do "Cristo na Terra", e invocando a inspiração da "dolce mama Caterina" que sempre soube falar aos Papa com afogueada sinceridade e incomparável humildade, venho pedir-lhe o socorro da firme autoridade em favor dos católicos do Brasil que sofrem o desamparo das autoridades na matéria que sempre constituiu o maior zelo da Mater et Magistra, que guarda o - depósito do preciosíssimo Sangue para distribuí-lo sob as espécies dos sinais sensíveis sacramentais, e também sob as espécies do ensino catequético. Santidade, o socorro especial que no momento dirijo à Santa Sé refere-se aos sucessivos "novos catecismos" para jovens, e mais especialmente aos últimos publicados que envio por especial favor do Núncio Apostólico.
COMO Vossa Santidade verá imediatamente num rápido primeiro exame, trata-se de uma obra extremamente vulgar que supõe nos moços brasileiros de 17 a 18 anos um grau de debilidade mental próxima da oligofrenia. Além disso, vê-se logo que a fenomenologia à bon marché em que se baseia, e metodologia da dinâmica de grupos só serve para conglomerar moços em torno de um mimetismo e de uma solidariedade etária sem nenhum valor moral. Se quisermos ver alguma forma nesse amontoado de "experiências" conduzidas pelos mais inexperientes homens do orbe, diríamos que temos um manual de adestramento da mais chato naturalismo, da mais ousada negação de todas as transcendências, com a agravante da má-fé com que, aqui e ali, usam o nome de Deus.
MAS se quisermos caracterizar formalmente o defeito dessas obras perniciosas, diríamos: total preterição da Igreja e do Papa como jamais protestante algum ousou fazer. Para os autores dessa ginástica holandesa de massificação jovem a Igreja e o Papa simplesmente não existem. E um dos sinais mais eloquentes desse alheamento à vida da Comunhão dos Santos, além do afrontoso desprezo da autoridade do Papa, é o desprezo que manifestam por todos os santos. Numa só página em 3 volumes aparecem nomes de santos num quadro de inepta caracterologia, onde S. Francisco de Assis é "nervoso ou instável", o Santo Cura d'Ars "sentimental ou melancólico", São Bento Labre "amorfo" (!!) e Santa Bernardette "apática" (!!!).
PARA exemplificar o que disse acima do defeito formal dessas perniciosas publicações, tomo a parte amplamente reservada ao sexo, aos amores humanos legítimos ou não, ao divórcio e ao anticoncepcionalismo. Tudo isto dirigido a jovens de 17 e 18 anos de ambos os sexos, sempre misturados demais e aproximados demais por padres famintos desta espécie de espetáculo.
NO CAPÍTULO relativo ao divórcio e à felicidade conjugal (vol. 2, p. 41), depois de uma "I Tempestade Mental", e de debates em que moços e moças de 17 a 18 anos discorrem sobre casos de infelicidade conjugal, chegam os autores a uma CONCLUSAO:
"UMA LUZ NO HORIZONTE”
A COMISSÃO Episcopal de Teologia da CNBB, reunida em Belo Horizonte de 17 a 20 de fevereiro de 1970, declarou no parecer dado ao projeto n.° 4217,62 do Deputado Nélson Carneiro: "Não quer a Comissão de Teologia deixar de reconhecer a existência de diversas questões complexas, vinculadas ao assunto, e que necessitam de ulteriores estudos."
É VERDADE que no fim desse tópico os autores dizem que "é melhor prevenir que remediar", coisa que a humanidade inteira já sabe, em todas as terras, em todos os tempos e sobre todos os assuntos. Descontado portanto esse óbvio excessivo, o que resta é que a questão do divórcio continua aberta a despeito de todos os pronunciamentos da Igreja.
MAIS nítido ainda é o capítulo que trata das pílulas anticoncepcionais. Há muitos esquemas, calendário para a prática da abstinência periódica, descrição de outros processos contraceptivos, abortivos e esterilizantes. Segue-se a recomendação da leitura edificante para os jovens: "Enciclopédia Bloch n.° 7", "Realidade", de maio de 68, "Fatos e Fotos", de abril de 67, "Manchete", de fevereiro de 70, "Pais e Filhos", n.° 2, "Ele e Ela",' de setembro de 70, "Life", "Control de la Natalidad", setembro de 70.
FALA-SE depois abundantemente em "amor", citam-se passagens do Antigo Testamento para provar que "nesse tempo houve uma subestima" de outro versículo, que aliás é do mesmo tempo. Invoca-se a Gaudium et Spes; mas, por uma estranha disposição de espírito dos autores, não há uma só menção à encíclica Humanae Vitae do Papa Paulo VI ainda reinante. O nome do Papa, a lembrança, a alusão ao fato de termos um Papa não ocorre uma só vez nesses opúsculos incentivados e aprovados pelas autoridades eclesiásticas da CNBB.
E É ESSA afrontosa omissão, esse desembaraço diante da Autoridade máxima da Igreja que constitui o defeito capital, a estrutura formal dessas obras; e assim fazendo, Santíssimo Padre, nós sabemos que não é somente a Sua pessoa que é esquecida e desprezada. O que é formalmente desprezado e ultrajado nessas obras perniciosas e vergonhosas para nosso clero é o preciosíssimo Sangue de nosso Salvador.
NESSE meio tempo citam-se abundantemente nomes alheios à história da Salvação: Lenine, Luther King e outros menos conhecidos.
Santíssimo Padre, permanete nella dolce dilezione di Dio, Gesú dolce, Gesú amore.