Publicado por Gustavo Corção, n’O Globo em 21-02-1974
“EM OSLO, a 13 de fevereiro de 1974, Dom Hélder receberá o "prêmio popular da paz". As notícias chegadas de lá nos dizem que numerosas pessoas e diversos movimentos de vários países tomarão parte na cerimônia. A atribuição desse prêmio significa, dizem as notícias, a vontade de apoiar em sua ação alguém que para muitos represente a luta pacífica dos oprimidos para conquista de um pouco de justiça."
LENDO este texto, o leitor de bom-senso julgará que se trata de um movimento anticomunista, porque todos nós estamos cansados de saber que desde 1917 nenhuma experiência humana feriu tão gravemente a justiça e a esperança dos pobres como o comunismo. Mas o leitor de bom-senso se engana, o texto veio dos comunistas que se reúnem na Noruega para glorificar Dom Hélder. Sim, Dom Hélder!
NÓS pensávamos que esse personagem já se pulverizara e já voltara ao nada, mas a notícia nos diz que ele está em Oslo, tentando cobrir com um prêmio "popular" o prêmio Nobel perdido. Continuemos a ler a notícia comunista: "As pessoas ou grupos que desejarem se associar a esse testemunho, e não souberem como fazer, podem enviar suas contribuições ao C.C.P. 2414. 13 de M. T. Nepére, 169, Avenue Jupiter 1190, Bruxelles, en mentionnant: " Prêmio da Paz, Dom Hélder Câmara."
EIS aí o trabalho de coleta, de encanamentos, calhas e esgotos construídos para a convergência de dinheiro em favor do amigo dos pobres de Olinda e Recife, que por uma curiosa configuração geográfica tem o centro em Oslo, e o centro do centro no bolso de Dom Hélder Câmara.
PARA mover e comover os sonhados doadores, o boletim que me enviaram transcreve passagens de uma conferência (inédita em francês) de Dom Hélder, pronunciada em 21 de agosto de 1973 em Rouland, Noruega, durante o encontro dos pastores luteranos dos países do norte sobre a "dimensão horizontal da Reconciliação". Perdão! Essa conferência pronunciada numa pequena cidade da Noruega, para pastores do norte, foi pronunciada em francês ou em norueguês? Eu não me espantaria se Dom Hélder a pronunciasse em javanês ou em candidomendês, porque "a dimensão horizontal da reconciliação" deve produzir o mesmo ruído em qualquer idioma. O essencial é que os amigos luteranos tragam o seu dinheirinho em francos, dólares ou marcos para o bolso de Dom Hélder. Como diria Teilhard de Chardin, tudo que chegar a este ponto-omicron converge. Eis o trecho do discurso que Dom Hélder teria pronunciado em línguas: "Para os opressores é muito cômodo e vantajoso que a Igreja se consagre à evangelização do mundo, que ela procure humanizar o mundo com exclusão de qualquer implicação política. Os que assim pensam, temendo a denúncia das injustiças e o combate não violento em favor da promoção do homem, não se dão conta que, deste modo, já tomaram uma opção política a favor da opressão..."
ATÉ hoje Dom Hélder não explicou em língua alguma como se fará esse "combate não violento" para arrancar do poder os opressores e para implantar o doce regime comunista. Imagino que os combatentes devam usar espingarda de rolha, e projéteis de manteiga de cacau, como os canhões humanitários do saudoso Barão de Itararé em Dom Xicote.
PROSSIGAMOS a instrutiva leitura do documento que nos anuncia a ressurreição de Dom Hélder no círculo polar ártico: "Mas nós, neste momento, poderemos nós fazer pequenas minorias sem recursos materiais em face das estruturas mais pesadas e opressivas do que nunca?"
NÃO, Dom Hélder, é claro que o Sr. e seus companheiros de luta não podem ficar em pequenas minorias sem recursos. É evidente que precisam inventar conferências, prêmios, para arrancar o rico dinheirinho com que se compram os melões. Ou quererá o leitor que Dom Hélder na era espacial faça milagres? Continua o documento: "Quem poderia imaginar que o átomo, tão minúsculo, pudesse conter desde milênios e para outros tantos milênios um tal poder? Quem poderá medir a força do amor se nós não nos fecharmos às inspirações do Espírito Santo?”
E EIS logo após como soa nos ouvidos de Dom Hélder o sopro divino: "... encorajemos, na escala regional e nacional a união de todas as minorias que, sob nomes diferentes, queiram de um modo pacífico, mas determinadas, verdadeiras e corajosas, sacudir o jugo das opressões."
COMO se vê, Dom Hélder sacode os adormecidos, Dom Hélder mobiliza as minorias que sob várias denominações queiram modificar a face da Terra, e para, evidentemente, é preciso lembrar que nada se faz sem dinheiro.
ESSE boletim que me veio parar às mãos, pode ser interpretado de dois modos diversos e até opostos. Muitos leitores certamente pensarão que Dom Hélder está se multiplicando, se espalhando e se tornando mais perigoso do que nunca.
O MEU pressentimento é oposto: parece-me que ele está estrebuchando para sobrenadar antes de mergulhar no descrédito total. Os apelos de dinheiro são significativos. Para mim, desconfio que seus empresários começam a desconfiar da inutilidade de suas caretas e da vacuidade de seus discursos. O pobre diabo de reformador do mundo, que já deixou de acreditar em tanta coisa, é capaz de estar começando a desconfiar de seus prestígios. Se isto se processasse pela via da humildade e da contrição, poderia ainda talvez achar o caminho perdido; mas se se processar pela via do orgulho ferido, do desânimo, então ele se precipita nos abismos.
QUALQUER hipótese eu tenho a esperança de não ouvirmos falar tão cedo nesta triste figura.